No País dos Arquitectos é um podcast criado por Sara Nunes, responsável também pela produtora de filmes de arquitetura Building Pictures, que tem como objetivo conhecer os profissionais, os projetos e as histórias por trás da arquitetura portuguesa contemporânea de referência. Com pouco mais de 10 milhões de habitantes, Portugal é um país muito instigante em relação a este campo profissional, e sua produção arquitetônica não faz jus à escala populacional ou territorial.
Neste episódio da quarta temporada, Sara conversa com o arquiteto Pedro Bandeira sobre o projeto para a Casa Rotativa e a sinergia necessária entre arquitetura e engenharia para desenvolver esta residência que efetivamente rotaciona em torno de um eixo vertical. Ouça a conversa e leia parte da entrevista a seguir.
Sara Nunes - A Casa Rotativa, tal como o nome indica, é uma casa que tem esta possibilidade de se mover, de rodar, mas antes de percebermos como é que funciona esta casa... sei que há aqui uma história curiosa com o proprietário porque o proprietário é seu irmão. E não só é seu irmão, como também é engenheiro, habituado a fazer projectos que são especiais, em termos de estrutura. E é uma pessoa que gosta, pelos vistos, também desta área da motorização. Perante esta casa fiquei muito curiosa: quem é que desafiou quem? Foi o arquitecto, ou foi o engenheiro? Quem é que desafiou a fazer esta casa e como é que surgiu depois esta vontade de fazer a casa desta forma, de modo a que ela se mova?
Pedro Bandeira - Já me fizeram essa pergunta várias vezes e eu não me lembro exactamente como é que isto surgiu. Há uma coisa que eu tenho a certeza: esta casa só existiria com o meu irmão. Eu acho que era difícil ter outra pessoa que acreditasse neste projecto e com o know-how dele, mas eu posso também acrescentar um pouco mais. Eu não seria arquitecto se não fosse também pelo meu irmão. Foi o meu irmão que, a determinada altura, quando eu no secundário, as minhas notas não eram assim especialmente altas... E a minha mãe estava muito preocupada comigo porque ela queria que eu fosse engenheiro civil, como o meu irmão. O meu irmão dizia: «Não sei se ele tem essa capacidade. Eu acho que era melhor ele ir para arquitectura.» Aquilo soou em mim e fiquei a pensar: «Arquitectura - nunca tinha ouvido falar do curso!» Mas a realidade é que me interessei pela arquitectura. E, desde o início, comecei a trabalhar com ele. Às vezes, até de uma maneira muito informal. Nas férias, ele punha-me a desenhar em papel vegetal, a passar a tinta-da-china alguns desenhos e pormenores de estruturas. E a realidade é que eu fui ganhando gosto à coisa. Há uns anos, habituei-me a trabalhar com ele. Sempre que era preciso uma situação difícil... Como por exemplo, quando trabalhámos juntos na Aldeia da Luz, em que foi preciso desenhar um depósito de água, que tem aquela forma da chaminé do edifício do Corbusier, de Marselha. Quando foi preciso desenhar esse depósito de água – como também era uma zona problemática, do ponto de vista dos sismos, etc., e a forma elegante daquilo implicava construir uma cofragem acessível para não tornar o projecto inviável – eu tinha a certeza de que o meu irmão era a pessoa indicada para fazer aquele projecto.
SN - O Pedro é um sortudo porque pode inventar aqui as coisas de arquitectura porque sabe que o seu irmão pode ajudar a tornar possíveis essas ideias.
PB - Isso sem dúvida!
SN - Já agora não referi o nome do seu irmão, que é o Filipe Bandeira.
PB - Exactamente.
SN - Sim, mas estava a contar a história...
PB - Bem... A realidade é que, a determinada altura, fui convidado para representar Portugal na Bienal de São Paulo pelo Paulo Cunha e Silva. E estava a pensar que tipo de propostas é que poderia fazer. Na altura, tinha uma casa elevatória que queria desenvolver. Pedi ajuda ao meu irmão e acho que foi numa dessas conversas – quando estávamos a pensar na estrutura elevatória da casa – que surgiu a hipótese de ela rodar. Aliás, na ideia do meu irmão, ele já queria fazer uma casa que fosse elevatória, mas que também pudesse rodar. E eu achei aquilo um bocadinho exagerado. Ficámos só na Bienal de São Paulo por uma casa elevatória, mas ficou sempre esta situação em...
SN - Background, não é? Na cabeça.
PB - E o que é certo é que depois houve ali uma oportunidade de ele pensar em construir uma casa. Começámos a falar nisso. Ele comprou um terreno e aí pensamos: «Ok. É esta oportunidade para fazer a Casa Rotativa porque, de outra maneira, provavelmente ninguém vai estar interessado. Ninguém vai querer financiar ou vai ser difícil convencer alguém a financiar.» Portanto, decidimos avançar com o projecto.
SN - Antes de falarmos um bocadinho mais sobre a casa, também fiquei aqui com outra curiosidade. Esta casa tem esta ideia muito experimental, até como acabou por dizer... achava que se calhar ninguém iria investir. Portanto vocês decidiram pôr mãos à obra e fizeram essa própria casa, se calhar até para mostrar que era possível ela funcionar, não é? Mas alguém vive na casa... o seu irmão vive mesmo na casa?
PB - O meu irmão vive mesmo na casa. A casa é para ele, mas eu queria... Quer dizer, não posso deixar de referir uma coisa que é... mesmo, o ano passado, quando ganhámos o prémio de Inovação e Tecnologia... eu acho que é importante ficar claro que – na realidade, o prémio que ganhámos é Sustentabilidade e Inovação – a casa não é propriamente um projecto inovador. A ideia de Casa Rotativa já existe há muito tempo. Aliás, nós podemos recuar ao fim do século passado e vamos encontrar moinhos que eram rotativos nas praias, no litoral de Portugal, do Minho até à Figueira da Foz. Eram rotativos para tirar o maior aproveitamento da energia eólica.
Ouça a entrevista completa aqui e reveja, também, a terceira temporada do podcast No País dos Arquitectos:
- João Maria Trindade
- António Cerejeira Fontes
- Studio MK27
- AND-RÉ
- Adriana Floret
- Pedra Líquida
- spaceworkers
- atelier extrastudio
- Sofia Couto e Sérgio Antunes
- Gonçalo Byrne
Nota do editor: A transcrição da entrevista foi disponibilizada por Sara Nunes e Melanie Alves e segue o antigo acordo ortográfico de Portugal.